sábado, 30 de agosto de 2008

Quem quer ser Jornalista Ambiental?

É mais fácil achar estudantes de Jornalismo interessados por esportes, cultura e política do que em meio ambiente
Por Luiz Guilherme Melo

Não é fácil fazer ciência num país que não incentiva nem valoriza a produção científica. É difícil não só para os pesquisadores (principalmente na questão do apoio financeiro), mas também para o jornalismo ambiental, porque a maioria dos veículos de comunicação locais não dão a atenção que deveriam. Enquanto isso, a maioria da população desconhece totalmente as descobertas cientificas; o que coopera para que as pessoas ainda tenham aquela imagem estereotipada do cientista descabelado e trancafiado num laboratório cheio de frascos com líquidos coloridos. E para piorar, são poucos os estudantes de Jornalismo dispostos a contribuir com a aproximação ciência-sociedade. “É difícil achar alguém que se interesse em se especializar em Jornalismo Ambiental”, disse a coordenadora editorial da revista Amazonas faz Ciência, da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (Fapeam), Grace Soares, em entrevista coletiva para estudantes do 5° período de Jornalismo do Centro Universitário do Norte (Uninorte).

A Amazônia é uma região rica, em todos os sentidos, principalmente no que diz respeito ao meio ambiente. “O que é feito aqui cientificamente interessa o mundo todo”, afirma a bióloga e estudante de Jornalismo Joanne Régis. Só do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) a produção de pesquisas científicas é intensa. E poucas ganham espaço na grande mídia, exceto as sensacionais. “O Diário do Amazonas é o único jornal que não reserva espaço considerável à ciência e tecnologia, a não ser que a notícia seja exótica”, afirmou Grace, citando o caso do filhote de gato que nasceu só com um olho e foi destaque em todos os jornais, TV´s e rádios locais.
Apenas o jornal Amazonas Em Tempo dedica um caderno diário ao meio ambiente. Na internet o espaço para assuntos científicos ou ambientais é maior. O Portal Amazônia, por exemplo, tem na sua página de notícias, uma editoria só para o meio ambiente, mas a produção de notícias é escassa. Durante a realização desta reportagem, havia apenas quatro notícias publicadas.

O que a ciência produz no Amazonas raramente chega ao conhecimento do grande público. A revista Amazonas faz Ciência, da Fapeam, traz reportagens sobre o que tem acontecido na região em termos científicos numa linguagem simples, com exemplos do dia a dia. Porém, a tiragem da revista é de apenas 10 mil exemplares por edição, e são distribuídas gratuitamente às bibliotecas públicas e centros de pesquisa. A população fica de fora. De acordo com Grace Soares, trabalham na produção da revista bimestral oito jornalistas e três bolsistas.
De fato é mais fácil achar alunos que querem fazer carreira no jornalismo político, cultural e até no esportivo que no ambiental. Joanne Régis é uma exceção. Formada em Ciências Biológicas pela Universidade Federal do Amazonas (Ufam) e pesquisadora da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), ela já entrou no curso de Comunicação pensando em seguir carreira no jornalismo ambiental, e assim contribuir para aproximar a sociedade da ciência. “O público quer saber sobre ciência e meio ambiente, mas a mídia cobre pouco o assunto”, diz.

E não é apenas o pouco espaço na mídia a maior dificuldade de se fazer jornalismo ambiental no Amazonas. Às vezes, o empecilho são os próprios pesquisadores. Alguns detestam que suas pesquisas sejam “simplificadas” para o povo ler; e também há cientistas que não fazem questão de ver suas pesquisas estampadas nas páginas de um jornal, pois isso não conta absolutamente nada para o seu currículo acadêmico. A relação cientista-jornalista nem sempre é amistosa. E isso não é de hoje.

Outra polêmica nessa relação é o fato de alguns cientistas pedirem para ler o material feito pelo repórter antes da publicação. Entretanto, o que é visto com “olhos tortos” por alguns jornalistas, pode ser uma oportunidade de evitar a veiculação de informações erradas, o que, sem dúvida, tiraria do sério o pesquisador que concedeu a entrevista. “O teu trabalho não é desmerecido quando é submetido ao cientista para uma avaliação prévia. No entanto, ele pode até mexer no texto para corrigir algumas informações cientificas, mas o estilo jornalístico ele jamais pode alterar”, afirma Grace. Outra: também não é tarefa nada fácil veicular uma informação científica, segundo os padrões jornalísticos, e muito menos trazer temas científicos para o dia a dia das pessoas. Talvez, por isso, não seja tão atraente quanto às outras editorias.

O jornal A Crítica já tentou criar um espaço só para jornalismo ambiental, mas, segundo Grace, apesar de não ter dado certo, o jornal se interessa pelo assunto. Por isso, manda seus repórteres cobrirem eventos científicos e publica essas matérias no seu caderno de notícias locais (Cidades).

No último dia 7 de abril, em comemoração ao dia do jornalista, houve uma palestra no Teatro Uninorte (Avenida Joaquim Nabuco, Centro) sobre jornalismo ambiental. A correspondente da Rede Globo no Amazonas, Daniela Assayag, disse que raramente matérias sobre meio ambiente são recusadas pelas grandes emissoras. Pudera, afinal, vivemos na Amazônia, o chamado “pulmão do mundo”, que para a sociedade brasileira e mundial ainda é um lugar misterioso. O que falta é os futuros jornalistas do Amazonas toparem o desafio de explorá-la. Jornalisticamente, é claro.

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