Filme ou vídeo não importa. O que importa é a criatividade, a imaginação, o poder de resumir em um minuto a grande idéia que está martelando seu cérebro. Tudo é importante nesse trabalho. Roteiro, captação de imagens, som, texto, produção, edição. Eu me acho uma grande cineasta de pequenos filmes. Tudo começou em 2000 com o cinema de resistência de Júnior Rodrigues que inventou essa história de filmes de um minuto. Logo me encantei com a idéia. Foi a primeira vez que ouvi falar de roteiro para cinema, tv, vídeo, rádio, publicidade. Desde então fui fazendo os cursos que ele ministrava. No final do curso ele pedia roteiros para serem filmados e concorrer no concurso. Quando isso acontecia minha cabeça fervilhava de idéias. Era até insuportável pois eu não tinha coragem de apresentá-las na frente da turma. Certa vez, à noite na livraria Valer levei mais de dez roteiros para a seleção e na hora falei de três. Nesse dia, depois da minha apresentação, uma dor de cabeça lancinante me fez sair correndo do local atrás de ajuda. Não queria incomodar a turma que estava escolhendo os roteiros para serem filmados depois. Fui à cata de alguém que me ajudasse. Estava muito mal. Não tinha ninguém fora da sala do curso. Encontrei, enfim, um senhor e lhe pedi um copo de água com açúcar. A dor diminuiu um pouco. Chamei a Suzi, minha filha, e fui para o pronto socorro. A pressão estava mais de 20. Naqueles dias estava passando por uma crise familiar e o esforço para falar em público deve ter me abalado.
Daí em diante não parei mais. Durante quatro ou cinco anos as idéias minavam minha mente na época do concurso do Júnior. O primeiro foi “Muros” que surgiu quando ao passar no Interbairros na Compensa/ Santo Antonio vi do ônibus um maravilhoso pôr do sol no rio Negro. E observei que muitos muros escondiam essa beleza que era para estar escancarada aos que passam pelo local. Daí já demonstrava o interesse pelo documentário. Do que você cria ao que você pode realizar vai uma grande distância. Sem recursos nenhum, apesar do apoio do Júnior, o filme resultou num fiasco. Mas um dia vou fazer o “Muros II” para corrigir isso.
Entre os filmes que escrevi resultantes das oficinas do Júnior Rodrigues estão o “Mundo Fashion” cujo nome original era “A moda que vem das ruas” que pretendia mostrar o jeito de vestir, de andar, de se enfeitar das pessoas e no final mostrou também as pessoas que vivem abandonadas nas ruas de Manaus. O “Bela Época” mostrava o descaso com os prédios históricos do centro da cidade. Além de mostrar o nosso patrimônio abandonado coloquei “na fita” uma jovem e seu pai num diálogo onde a menina tinha mais consciência de preservar a história do que seu próprio pai. O “Caldo de Caridade” foi baseado no livro de Chloé Loureiro, Doces Lembranças, e na hora da gravação faltou “apenas” a artista principal. E como sempre tudo foi improvisado e as falas decoradas na hora. Teve também uma tentativa de musical-documentário. Pretendia em um minuto contar a história do enterro de Eduardo Ribeiro cujo corpo foi levado ao cemitério em um bonde oficial e luxuoso. Isso com dançarinos e música. As gravações aconteceram no bondinho que estava ainda no Chaminé. O mesmo e único que hoje está no Largo São Sebastião. Aí faltou de tudo na hora. O filme era “complexo” demais. Montagem de cenários, figurinos, personagens infantis e um casal de bailarinos. Gente, nunca vi tanta improvisação. De cara faltou o casal de dançarinos. A produtora havia esquecido de avisar os “contratados”. Então no cúmulo da improvisação ela mesma “dançou”. O Júnior chamou um amigo bailarino que fez partner com ela. O figurino das crianças, eram mais de quinze vestidos, foi descosturando aos poucos. Era um tal de “prega” bainha e alça sem parar. As crianças, ansiosas, começaram a “pintar no set”. Não podia dar em outra coisa. Fiasco de público e crítica. O filme tinha um bonito nome: “Um bonde chamado saudade”.
Para Júnior Rodrigues, no cinema amazonense faltam bons projetos e apoio financeiro. A formação, para ele, precisa ser intensificada no setor. “O Estado e o Município não possuem uma política cultural adequada para o cinema”. E conclui: “Precisamos das secretarias de cultura mas não dependemos delas para fazer o nosso cinema”. Esse movimento vai longe. Tanto que já surgiu o Curta 4, uma empreitada de muito trabalho e dedicação do seu criador.
*Ellza Souza é jornalista formada pela Universidade Federal do Amazonas (Ufam). Escritora e Roteirista.
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