A liberdade de ser artista
“Quando meus sentidos processam reflexões ou dúvidas da atualidade em que vivo, agitando incontrolavelmente meu interior, e me levando a externar isto numa montagem teatral; neste instante há liberdade”.
Para mim a arte é essencialmente autônoma. E nos 26 anos que tenho produzido teatro em Manaus meu caminho sempre foi o da liberdade criativa. Este tem sido meu sismógrafo para reflexões sobre o que me inquieta. Sei que em nossa atualidade (onde há manipulações constantes de idéias, pensamentos etc.) não é fácil (alguns diriam impossível) qualquer tipo de liberdade; porém, acreditar nesta possibilidade é o que me mantém artista.
Quando meus sentidos processam reflexões ou dúvidas da atualidade em que vivo, agitando incontrolavelmente meu interior e me levando a externar isto numa montagem teatral; neste instante há liberdade. Sendo assim, minha produção não seria possível com uma autonomia parcial ou diminuída, controlada por outros. Por exemplo: criar peças por encomendas, com temas e funções determinadas por quem quer que seja não me interessaria. Tanto o é que nos últimos anos tenho trabalhado no projeto Tragecontemporâneo, onde montamos Medéia, Prometheu e agora Antígona, espetáculos que falam sobre a conflitante relação do homem com o poder. Tais temas não são muito discutidos atualmente, pois eles levam à reflexão e à mudanças. Por isso acredito ser importante discutir, pensar e debater nossa autonomia. Afinal, precisamos ter consciência se trabalhamos a serviço de alguém, quem é, e por que o fazemos.
Aqui em Manaus, é difícil para qualquer artista conseguir verba para suas montagens. E se essas montagens falam sobre assuntos que não interessam às instituições culturais é pior ainda. Dentro deste quadro minha dificuldade é imensa. Muitos grupos teatrais passaram a fazer espetáculos por encomenda para várias instituições a fim de melhorar sua infra-estrutura; mas para mim é um preço alto demais a se pagar. Então, auto gerir um grupo teatral como o meu, é lidar constantemente com a falta de recursos e descaso de entidades culturais. Essa mentalidade das instituições de financiarem apenas projetos artísticos dentro dos interesses que lhes convém, limita o desenvolvimento da arte enquanto expressão livre do indivíduo. Estou certa de que isto é um desrespeito ao artista e sua autonomia. No entanto, há uma maciça divulgação colocando estas instituições como benfeitoras da cultura. Na verdade elas beneficiam a si próprias e muitos artistas são instrumentos destes interesses particulares. Vejo este panorama se expandir cada vez mais em nosso país e acho preocupante, pois é uma forma de moldar o fazer artístico que será apresentado à sociedade. Sendo assim, o que será do artista que não permite que seus trabalhos sejam moldados? Ficará à margem? Não terá verba para continuar existindo? Até quando permitiremos que as produções artísticas de nossa cidade sejam um veículo de propaganda destas instituições? Precisamos refletir sobre estas questões para agirmos com mais consciência no fazer cênico do nosso município.
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